Tudo tem peso.
O teu é bem conhecido das traseiras
porque a tua pesada sombra não deixa aparecer a estrada, a pintura ou a escrita
postos à janela.
Tens espaço também, muito espaço
no vazio.
O ar é poluído e os caixotes do lixo
e a tua alma também, desde que a trocaste por carbono.
E o teu coração, desde que as artérias colapsaram
e recusaram conceder cidadania
ao sangue vindo do fundo da tua cabeça.
Sem memória, perderias muito peso.
Precisas seguir uma dieta rigorosa
para perderes mais de ti.
Decide-te rapidamente,
porque a gravidade da Terra
não espera muito.
Dica: substitui o fator tempo pelo teu nome
para descobrires como atirar a última lágrima
do teu diário
direta para o cesto do lixo.
Consomes ar basto para dois recém-nascidos
se os gritos fossem iguais,
dado que as moléculas de ar à tua volta
transportam mal o som e a tua garganta
precisa de reparação.
Uma mulher mendiga acima dos cinquenta exibe dignidade num
farrapo cheio de moedas. Reza para que tu e a
mulher bonita que está contigo
sejam em breve abençoados com uma criança,
para encher outra parte do vazio
em troca de uma moeda.
Chegou a hora de aprenderes os passos, não sexuais,
e de mudares as meias mal-cheirosas.
Fato científico: bactérias crescem rapidamente.
Rende-te ao sono,
porque chegou a hora de derreteres e dissolveres
e tomar a forma alienada em que foste servido.
Evapora, condensa
e volta para o teu vazio,
para ocupares o espaço habitual
em ti.
Ashraf Fayadh (Instructions Within, The Operating System, Brooklyn, 2008)
Translation José Pinto
English version Jonathan Wright
Publicado Revista Palavra Comum, Galiza, 2016