Pôr os olhos no caminho

No ilhéu, fetos movem-se no lago impoluto e
centenas de pais atiram filhos ao ar sem que caiam,
ao começo do dia, do movimento,
do movimento nascente ao longo de uma serpente a
serpentear pelas costas até à base do pescoço,
ao Pai Xangô, a Serápis e às pítias,
sustendo o vislumbre alto de onde um
rebentamento vertígico se dissolve
no lado de lá
para comungar com o invisível,
celebrar o ar a deslocar-se,
o vento a abanar a realidade,
sobreviver ao campo circular devastado,
estendendo a mão a um sopro raiado
a descer como água em cascata sobre
o corpo a pender entre o fim do medo e
o princípio da visão confiante dum olho
a auscultar translúcido um sentimento terreal e
a refazer da poeira, a festa de abraçar-te.

© Rui Belo

Editor Nova Mymosa, Portugal, 2021
Revisão Susana Ladeiro
Projeto gráfico e impressão
milideias.pt
ISBN
978-989-8981-43-1

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